15/04/15 -
Nesta terça, 14, faz um ano que o Boko Haram raptou quase 300 meninas numa escola no nordeste da Nigéria. Cerca de 50 delas conseguiram escapar e sabe-se que o restante é submetida à violência sexual e casamentos forçados. O grupo extremista existe há mais de 10 anos, mas foi somente com essa atrocidade que houve uma reação global expressiva, a campanha Bring Back Our Girls. O que mudou desde então?
Apesar das pressões internacionais, o governo da Nigéria fez poucos avanços no enfrentamento ao Boko Haram, que continua a controlar áreas expressivas no norte e nordeste do país e até lançou operações contra grandes cidades, como Maiduguri. Essas dificuldades refletem a fragilidade das Forças Armadas nigerianas, com uma história de brutalidade contra a própria população, corrupção generalizada, alto índice de deserção e baixa qualidade de liderança.
Novo presidente- Contudo, a crise política resultante dos ataques do Boko Haram teve consequências importantes para o país, como a derrota do presidente Goodluck Jonathan em sua tentativa de reeleição, em março de 2015. Foi a primeira vez que isso aconteceu com um chefe de Estado da Nigéria e ele aceitou a perda pacificamente. Seu partido governava o país desde a redemocratização em 1999.
Jonathan será substituído pelo general Muhammadu Buhari, um ex-ditador que havia tentado voltar ao poder democraticamente três vezes, antes de ser bem-sucedido na quarta. A política nigeriana é marcada desde 1960 por clivagens étnicas e religiosas - basicamente, norte islâmico x sul cristão. Não foi diferente em 2015, mas chama a atenção o quanto essa divisão foi menos pronunciada, com muitos eleitores meridionais votando por Buhari, um muçulmano nortista que defendeu no passado a implementação da lei religiosa (sharia) em sua região.
Uma análise do Boko HaramBuhari prometeu acabar com o Boko Haram, mas tem pela frente inúmeros problemas. Para marcar o aniversário do rapto, a Anistia Internacional lançou um relatório detalhado e impressionante sobre as violações de direitos humanos cometidas pelo Boko Haram. Baseado em quase 400 entrevistas com vítimas e autoridades nigerianas, o estudo documenta estupro, detenção arbitrária, tortura, rapto, desaparecimento forçado, assassinato, uso de crianças-soldados, roubo, destruição de propriedade em cerca de 230 ataques contra civis.
O Boko Haram foi fundado em 2002 como um movimento islâmico que prega uma versão fundamentalista da religião e rejeita de forma categórica influências da cultura ocidental - incluindo o Estado nacional e os cristãos nigerianos. Desde o fim da década de 2000 o grupo tem executado ataques armados contra policiais, militares, funcionários de organizações internacionais e filantrópicas e população civil.
O extremismo do grupo encontrou campo fértil nas condições sociais do norte e do nordeste da Nigéria, regiões ainda mais precárias do que o resto do país. Por exemplo, lá a pobreza é 69% (contra 61% da média nacional) e o analfabetismo chega a 65% (versus 33%). As tropas do Boko Haram em geral são formadas por rapazes pobres, de pouca instrução e desempregados, que, aliás, são usados tradicionalmente como capangas das demais milícias étnicas e religiosas que assolam o país.
Não há saídas rápidas e fáceis para as atrocidades cometidas pelo Boko Haram e grupos semelhantes, como o Estado Islâmico e o Al-Shabab - que há poucos dias assassinou 150 estudantes numa universidade no Quênia. Todos são frutos de longos anos de colapso do Estado em meio a conflitos sectários, étnicos e religiosos. Contudo, a pressão internacional pode desempenhar um papel positivo, compelindo autoridades relutantes a agir.
Fonte: Yahoo